Como abordar...Sopros cardíacos em filhotes felinos
Número da edição 29.1 Outros conteúdos científicos
Publicado 04/01/2021
Disponível em Français , Deutsch , Italiano , Español e English
Diarreia do intestino grosso é um distúrbio comum em gatos jovens atendidos em clínicas veterinárias gerais e, como explica Dan Thompson, a infecção por Tritrichomonas foetus é um importante diagnóstico diferencial.
O diagnóstico deve ser formulado com base na detecção do parasita por microscopia direta de esfregaços fecais, PCR fecal e coprocultura.
Aparentemente, a prevalência de Tritrichomonas foetus é maior em gatos de raça pura e naqueles que vivem em colônias. O aumento no risco de infecção também foi associado ao uso de bandejas sanitárias compartilhadas e higienização social (como lambedura).
O tratamento com agentes antiparasitários empíricos não é recomendado na suspeita de Tritrichomonas foetus sem uma investigação mais detalhada.
O Tritrichomonas foetus tem uma distribuição mundial, com prevalência estimada entre 10 e 59% 1. Existem dados relativamente limitados sobre sua prevalência geográfica específica; no entanto, em um único estudo em uma população de gatos do Reino Unido, estimou-se que aproximadamente 20% dos gatos saudáveis possam ser portadores do protozoário. Em outro estudo sobre a prevalência de Tritrichomonas foetus em amostras fecais diarreicas enviadas a um laboratório do Reino Unido, o parasita foi identificado em 14,4% das amostras 2. Por outro lado, nos Estados Unidos, verificou-se que uma população de gatos de exposição tem maior prevalência de Tritrichomonas foetus, sendo da ordem de 31% 3.
Parece que os gatos de raça pura e aqueles que vivem em colônias têm maior prevalência de Tritrichomonas foetus. Foi demonstrado que os animais alojados em espaços pequenos (menor metro quadrado por gato) têm maior probabilidade de serem portadores da doença, sugerindo que a densidade populacional desempenhe um papel significativo no risco de infecção. Do mesmo modo, um aumento no risco de infecção foi associado ao uso de bandejas sanitárias compartilhadas e higienização social como lambedura 2 3.
A diarreia causada por Tritrichomonas foetus geralmente afeta gatos jovens, com idade média de 8 meses (mais de 75% dos animais acometidos têm menos de 1 ano de idade). Contudo, gatos de qualquer idade podem ser portadores, e alguns deles podem desenvolver sinais clínicos 1 4
O Tritrichomonas foetus é um protozoário flagelado que só existe na forma trofozoíta. Como tal, não há formação de cisto (ao contrário do que acontece com a giardíase), e sua reprodução ocorre por fissão binária simples. Do ponto de vista morfológico, esse microrganismo é caracterizado por ter aproximadamente 10-26 µm de comprimento, cerca de 3-5 µm de largura e formato de “pera” ou “fuso”. Cada microrganismo possui três flagelos anteriores (em comparação ao Pentatrichomonas, que tem cinco), conferindo-lhe motilidade (Figura 1) 1 5.
Nos gatos, o Tritrichomonas foetus é principalmente um parasita do trato gastrointestinal, sobretudo do intestino grosso e, em menor grau, da porção distal do íleo 6. Isso provoca uma inflamação da mucosa intestinal, que se manifesta como colite linfoplasmocitária ou neutrofílica 7. Outros sinais clínicos que também foram registrados repetidas vezes incluem irritação anal e, ocasionalmente, incontinência fecal. Quando encontrado no intestino grosso, esse protozoário coexiste em estreita proximidade com a superfície da mucosa intestinal e frequentemente pode estar associado às células epiteliais e criptas do cólon. Uma vez em contato com a parede colônica, o parasita se liga à mucosa por meio de interações entre ligantes e receptores específicos, cuja ligação é competitiva e saturável. O parasita se une a várias moléculas de superfície celular, incluindo lectinas específicas para o ácido siálico, lipofosfoglicanos, cisteinaproteases e proteínas de adesão. Uma vez ligado, esse microrganismo parece capaz de degradar as imunoglobulinas e lactoferrinas, permitindo a evasão (fuga) do sistema imunológico 8.
A transmissão do parasita ocorre quase exclusivamente por via orofecal. Os trofozoítos são eliminados nas fezes de gatos colonizados e infectam outros gatos se ingeridos. Atualmente, não existem hospedeiros intermediários comprovados; no entanto, foi demonstrado que os trofozoítos do Tritrichomonas foetus podem sobreviver à ingestão e transitar através de moluscos gastrópodes terrestres (como as lesmas), permanecendo infecciosos se consumidos subsequentemente por um gato suscetível (Figura 2) 9. No ambiente, os trofozoítos podem sobreviver por vários dias se as fezes estiverem úmidas, mas secam e morrem em um ambiente seco e aeróbico 10.
Apesar da diarreia e da inflamação da região perineal, a maioria dos pacientes acometidos aparentemente se encontra saudável sob outros aspectos. Alguns gatos podem demonstrar um retardo no desenvolvimento e, ocasionalmente, um escore de condição corporal abaixo do ideal. Embora outros achados inespecíficos também tenham sido descritos (como má qualidade do pelo), não se espera que outros sinais específicos sejam observados 1 5
Os dados sobre o paciente e seu histórico clínico devem levantar a suspeita de infecção por Tritrichomonas foetus. A lista de diagnósticos diferenciais está exposta na Tabela 1 e, para diferenciar o Tritrichomonas foetus desses outros distúrbios, deve-se realizar uma avaliação clínica completa e minuciosa.
Tabela 1. Lista de diagnósticos diferenciais para diarreia do intestino grosso em gatos.
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Em casos de Tritrichomonas foetus, os achados dos exames de sangue de rotina são geralmente inespecíficos e, com frequência, os parâmetros estão dentro dos intervalos de referência. Tendo em mente a tenra idade da população de pacientes com maior risco de Tritrichomonas foetus, é importante não superinterpretar os parâmetros que já se encontram alterados em animais jovens (como fosfatase alcalina e fosfato elevados) quando alterações nos testes sanguíneos estiverem presentes. Também podem ser observadas algumas alterações secundárias aos sinais clínicos crônicos. Os exemplos mais comuns dessas alterações são desequilíbrios eletrolíticos em consequência da diarreia contínua, especialmente hipocalemia, hiponatremia e hipocloremia. Em geral, essas alterações são de natureza leve e subclínica, embora possam ocorrer alterações mais acentuadas em casos mais graves 1 5.
Embora não haja alterações sanguíneas específicas para o Tritrichomonas foetus, o exame de sangue ainda constitui um elemento essencial do procedimento diagnóstico, pois permite descartar outros distúrbios do diagnóstico diferencial, identificar comorbidades e avaliar alterações eletrolíticas que precisam ser tratadas como parte do plano terapêutico.
Do mesmo modo que os exames de sangue, as técnicas de diagnóstico por imagem fornecem relativamente poucas informações quanto a achados específicos em gatos com Tritrichomonas foetus 5. Nos casos graves em que há uma colite acentuada, pode haver evidências de espessamento (local ou difuso) da mucosa colônica na ultrassonografia abdominal, embora a ausência de tais achados não descarte o parasita como uma causa. Nos casos em que se observa um aumento na espessura da parede intestinal, não se espera nenhuma perda de estratificação dessa parede — se presente, isso aumentaria a suspeita de doença neoplásica infiltrativa em vez de Tritrichomonas foetus.
Tal como acontece com os exames de sangue, ainda há uma boa razão para realizar as técnicas de diagnóstico por imagem nesses casos. A ausência de outros achados clínicos apoia indiretamente o Tritrichomonas foetus como o agente causal, e a obtenção de imagens é uma ferramenta valiosa para a investigação dos diagnósticos diferenciais.
O diagnóstico definitivo do Tritrichomonas foetus pode ser obtido por meio da visualização direta do microrganismo ou pelo teste de PCR (reação em cadeia da polimerase) nas fezes. A coprocultura também pode ser realizada antes da preparação da amostra para o exame fecal direto ou para a técnica de PCR, a fim de obter um maior número de microrganismos e, portanto, aumentar a sensibilidade dos testes.
A visualização direta do parasita é conseguida por microscopia óptica em esfregaço fecal. Trata-se de um exame relativamente simples que requer apenas um microscópio óptico com lâmina e lamínula, sendo o teste de escolha para a detecção do Tritrichomonas foetus. Portanto, todos os gatos com diarreia do intestino grosso devem ser submetidos a esse teste na primeira consulta. É importante notar que, ao realizar uma avaliação de esfregaço fecal, tanto a Giardia como o Pentatrichomonas hominis podem ser muito parecidos com o Tritrichomonas foetus à microscopia óptica e, por essa razão, é preciso ter cuidado para identificar com precisão qualquer parasita visualizado 3 11. Isso é particularmente importante porque influencia a tomada de decisões terapêuticas, uma vez que o Pentatrichomonas hominis é um protozoário não patológico que não necessita de tratamento 1, enquanto a giardíase geralmente responde melhor ao tratamento que o Tritrichomonas foetus e pode ser erradicada com o uso de medicamentos antiparasitários de rotina (p. ex., fembendazol), ao contrário do Tritrichomonas foetus.
Para realizar o exame direto, as amostras podem ser preparadas de diferentes maneiras. A coleta de amostras de material fecal eliminado espontaneamente é o método mais simples; no entanto, se o paciente se recusar a defecar dentro do ambiente hospitalar, foram descritos outros métodos bem-sucedidos para obtenção das fezes. Vale ressaltar que as amostras adquiridas de fezes normais não diarreicas raramente produzem resultados positivos e, portanto, não é recomendável realizar o teste nesse tipo de amostra 1.
Foi constatado que o uso de uma sonda retal para adquirir material fecal de dentro do cólon é um meio adequado para recuperar uma amostra, assim como a lavagem do cólon 1. A lavagem do cólon é uma técnica semelhante ao lavado traqueal, por meio do qual se instila líquido no reto e no cólon com o gato sob sedação. Após a instilação, pode-se realizar uma leve palpação transabdominal do intestino grosso para facilitar a mistura do material antes da retirada do líquido. Essa técnica pode gerar dois tipos de amostra: a primeira consiste em uma suspensão que pode ser colocada em uma lâmina para exame sob microscopia óptica direta; a segunda é uma amostra maior que pode ser centrifugada para obter um precipitado e realizar uma PCR.
Com a preparação úmida, pode-se fazer um esfregaço fecal a fresco. A partir das amostras de lavagem do cólon, uma gota do material suspenso pode ser colocada em uma lâmina, deixando-a secar ao ar. Para as amostras coletadas a partir de fezes diarreicas ou da sonda retal, a amostra deve primeiro ser suspensa em uma solução salina estéril antes de processá-la. Uma vez seca, a amostra pode ser fixada e corada utilizando o corante Romanowsky para ajudar na visualização do parasita na própria clínica. Após a aplicação de uma lamínula, a amostra pode ser visualizada sob microscópio óptico com aumento de 20x ou 40x. Baixar o condensador pode ajudar a melhorar a identificação.
Para realizar o exame de fezes, as amostras devem estar frescas, ou seja, recém-coletadas (menos de seis horas após a sua coleta) 1; portanto, enviá-las para um laboratório externo não é o ideal.
Depois de seis horas, a sensibilidade dos esfregaços fecais frescos como teste diagnóstico para a pesquisa de Tritrichomonas foetus começa a diminuir. Por essa razão, é recomendável realizar o exame fecal dentro da própria clínica, imediatamente após o preparo da amostra 12. Além de a avaliação do esfregaço fecal fresco ser um método de diagnóstico muito simples e barato, o teste tem uma especificidade muito alta (i. e., a aparente identificação do parasita significa que sua presença é muito provável); no entanto, esse teste tem sensibilidade muito baixa. Em um estudo para quantificar a sensibilidade do exame fecal fresco, constatou-se que a sensibilidade de uma única amostra era de apenas 14%; por isso, é fortemente recomendada a avaliação de vários esfregaços de múltiplas amostras para aumentar a probabilidade de identificação do microrganismo 3. A sensibilidade pode diminuir ainda mais pela presença de contaminantes na amostra, como granulado de areia da bandeja sanitária; por esse motivo, se a amostra for enviada a um laboratório externo, é essencial separar esse tipo de contaminante antes do envio 12. A sensibilidade do teste também pode ser reduzida pelo uso de antibióticos, como o metronidazol; por isso, o tratamento com antibióticos deve ser interrompido pelos menos alguns dias antes do exame fecal para atenuar seu efeito 1.
Dan Thompson
O PCR fecal constitui um método diagnóstico alternativo para a detecção do Tritrichomonas foetus. A técnica de PCR pode ser o primeiro teste de diagnóstico a ser realizado, porém é mais cara e requer mais tempo que a avaliação do esfregaço fecal; por esse motivo, é frequentemente executada após um resultado negativo no esfregaço. Em função da baixa sensibilidade do esfregaço fecal, todos os casos em que há suspeita de Tritrichomonas foetus (mas sem identificação à microscopia) devem ser submetidos ao exame de PCR. Esse teste também pode ser usado para confirmar o diagnóstico obtido no esfregaço caso haja dúvida na identificação precisa do parasita.
O teste de PCR baseia-se na detecção de uma das regiões altamente conservadas do genoma do Tritrichomonas foetus e, para isso, é comum o uso de primers que amplificam os genes ITS1 e ITS2 13. A técnica de PCR é capaz de detectar parasitas vivos e mortos; foi relatado que uma quantidade de até 10 microrganismos em uma amostra é suficiente para a detecção 14. Embora a sensibilidade do exame de PCR não tenha sido descrita, é provável que ela seja consideravelmente maior que a do esfregaço fecal. Também é provável que a sensibilidade varie dependendo da densidade de microrganismos na amostra, de tal modo que, quanto maior o número de parasitas, maior a sensibilidade.
Uma característica importante do teste de PCR é sua alta especificidade para o Tritrichomonas. Isso significa que, quando um gato é portador de Giardia ou Pentatrichomonas (que podem ser erroneamente interpretados como Tritrichomonas foetus no esfregaço), o PCR será negativo e não detectará esses outros parasitas, a menos que haja uma coinfecção com o Tritrichomonas foetus 11. Isso torna a técnica de PCR um teste valioso para confirmar o resultado do esfregaço fecal fresco; por essa razão, é fortemente recomendável realizar um PCR juntamente com a análise do esfregaço fecal em todos os casos 15.
As amostras para o exame de PCR podem ser adquiridas do mesmo modo que aquelas utilizadas para o esfregaço fecal. Novamente, para aumentar a sensibilidade do teste, é aconselhável obter várias amostras de diferentes dias, misturá-las e enviar a amostra final ao laboratório, uma vez que há relatos de liberação (eliminação) intermitente do parasita 7. As amostras de diarreia podem ser enviadas frescas (ou seja, recém-coletadas) ou, então, as amostras de lavagem do cólon podem ser centrifugadas para obter um precipitado e enviá-lo para subsequente exame.
Embora a sensibilidade do teste de PCR seja supostamente maior que a do esfregaço fecal, esse teste também pode gerar resultados falso-negativos pela presença de um pequeno número de parasitas nas amostras. Para melhorar a sensibilidade do teste, é necessário obter um maior número de microrganismos. Uma solução para isso seria realizar a cultura do microrganismo antes do teste.
Existe um kit comercial disponível1 (Figura 4) para a cultura de Tritrichomonas foetus a partir de amostras fecais. Esse kit consiste em um sistema fechado, no qual é necessário inocular uma amostra muito pequena de fezes (mais ou menos do tamanho de um grão de arroz). A cultura levará em torno de 72 horas se a bolsa for incubada a uma temperatura de 37°C, podendo demorar até 12 dias à temperatura ambiente (16). A desvantagem desse teste é, portanto, o longo período de tempo antes do diagnóstico; entretanto, também há vantagens. A primeira delas é que um maior número de microrganismos aumentará a sensibilidade do esfregaço fecal e do PCR. A segunda vantagem é que o kit também contém uma série de inibidores de crescimento que impedem a cultura concomitante de Giardia ou Pentatrichomonas. Como esses inibidores evitam o crescimento de ambos os parasitas, é muito provável que qualquer protozoário detectado no exame de esfregaço fecal pós-cultura seja o Tritrichomonas foetus e não outro parasita 16.
1 “InPouch TF” (Biomed Diagnostics, White City, OR)
Diante das informações expostas anteriormente, a coprocultura é considerada o teste com padrão de excelência para o diagnóstico de Tritrichomonas foetus, seguida do esfregaço fecal direto e do PCR fecal.
O tratamento e a eliminação do Tritrichomonas foetus pode ser um processo complexo e frustrante. Muitas vezes, os pacientes parecem responder clinicamente ao curso terapêutico com metronidazol, mas esse medicamento não é capaz de erradicar a infecção; portanto, apesar da melhora inicial nos sinais clínicos, a interrupção do medicamento resultará em recidiva da diarreia 12. Na verdade, parece que o tratamento com metronidazol pode prolongar a duração dos sinais clínicos e, por isso, seu uso não é recomendado para casos confirmados 1. Do mesmo modo, não se considera apropriado utilizar o metronidazol como teste terapêutico para diferenciar Giardia (que, às vezes, pode ser eliminada com o metronidazol) do Tritrichomonas foetus (que nunca é erradicado com o metronidazol).
Infelizmente, o Tritrichomonas foetus parece ser relativamente resistente aos tratamentos antimicrobianos e antiparasitários convencionais. Hoje em dia, só há um medicamento descrito como eficaz na erradicação das infecções. Trata-se de outro agente da família dos nitroimidazólicos, o ronidazol 17. O ronidazol não estava registrado nem era aprovado para uso em gatos em nenhum país no momento da redação deste artigo, mas está disponível em algumas farmácias de manipulação veterinária para uso fora da autorização usual na ausência de um tratamento eficaz aprovado. Apesar de relativamente caro, esse tipo de formulação é recomendado, uma vez que a farmácia fornece fórmulas e doses confiáveis. Se essa opção não estiver disponível ou se o custo for muito alto, também é possível adquirir o medicamento em pó, uma formulação utilizada para tratar doenças parasitárias em pombos. Essa formulação em pó não pode ser recomendada como medicamento de primeira escolha, em virtude da qualidade desconhecida e da fórmula potencialmente variável, embora haja relatos sem comprovação científica de eficácia na erradicação de infecções felinas.
O esquema de dosagem descrito para o ronidazol é de 30 mg/kg a cada 24 horas por via oral durante 14 dias 18. Embora esse medicamento seja bem tolerado por muitos gatos, vários efeitos colaterais já foram relatados. Tais efeitos colaterais tendem a ser de natureza semelhante àqueles observados com altas doses de metronidazol, e a maioria deles se relaciona à neurotoxicidade. Os efeitos colaterais mais comuns incluem letargia, hiporexia (apetite reduzido), ataxia e, se o medicamento não for interrompido, crises epilépticas 19. A maioria dos efeitos colaterais desaparece rapidamente quando a medicação é suspensa; no entanto, será necessária a instituição de cuidados de suporte se o tratamento não for descontinuado assim que os efeitos colaterais forem vistos 1. Os efeitos colaterais são consideravelmente mais comuns que os do metronidazol; acredita-se que isso esteja relacionado com a meia-vida mais longa do ronidazol em comparação à do metronidazol.
Se a diarreia recidivar após o tratamento, pode parecer razoável a repetição desse tratamento a princípio, principalmente se houver uma melhora acentuada com a medicação, seguida de uma deterioração abrupta após a suspensão. Entretanto, se houver um período de boa saúde após o curso terapêutico inicial, seguido de um agravamento semanas a meses depois, o mais sensato seria confirmar a presença de Tritrichomonas foetus novamente, uma vez que os sinais clínicos podem ser atribuídos a outras causas.
Além do tratamento com o ronidazol, existem provas limitadas sobre outras estratégias terapêuticas. Embora o autor não tenha conhecimento de nenhuma publicação a respeito das recomendações nutricionais para essa doença em particular, as diretrizes gerais para o controle de enteropatias podem ser levadas em consideração; deve-se investigar se houve alguma mudança da dieta, uma vez que isso pode ocasionalmente provocar diarreia do intestino grosso, sobretudo quando a dieta é de baixa qualidade ou não balanceada.
Não é apropriado suplementar com antimicrobianos. Por não haver provas para apoiar ou rechaçar o uso de nutracêuticos e probióticos, nenhuma recomendação pode ser feita nesse sentido.
Com o ronidazol, costuma haver uma melhora relativamente rápida na consistência e qualidade das fezes nos primeiros 14 dias de tratamento. Em casos mais graves, no entanto, pode demorar um pouco mais para se observar uma melhora; acredita-se que isso reflita o nível de inflamação do cólon em decorrência da maior carga parasitária 1. Em gatos não tratados contra o Tritrichomonas foetus, a diarreia pode apresentar uma resolução espontânea em cerca de 88% dos casos, mas isso pode levar até 2 anos para acontecer 20. Um total de 55% dos gatos com resolução espontânea permanece infectado e, portanto, pode continuar a eliminar os trofozoítos no ambiente, o que os torna um risco de infecção contínua para outros gatos. Por essa razão, esse tipo de estratégia (ou seja, a de aguardar a resolução espontânea sem tratamento) não é recomendado.
A diarreia do intestino grosso é um distúrbio relativamente comum em gatos jovens atendidos em clínicas veterinárias. O Tritrichomonas foetus é uma parte importante do diagnóstico diferencial para essa manifestação clínica e, portanto, deve ser pesquisado no início da avaliação diagnóstica. Os testes com padrão de excelência incluem a realização de coprocultura, seguida do esfregaço fecal direto e do PCR fecal. Uma vez estabelecido o diagnóstico, deve-se instituir o tratamento; atualmente, o ronidazol é o único medicamento eficaz conhecido.
Dan Thompson
O Dr. Thompson se formou na Cambridge University em 2013 e, a princípio, trabalhou em uma clínica geral de pequenos animais. Leia mais